sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Nelson Rodrigues

É muito provável que já alguém tenha reparado nisto, até porque é cada vez mais difícil determinar o nível cultural dos leitores de um jornal a partir das coisas que nele se publicam. Seja como for, o Francisco José Viegas e o João Pereira Coutinho, só para referir dois exemplos óbvios, escrevem regularmente no Correio da Manhã e já hão-de ter dado conta da existência na casa de um jornalista chamado Nelson Rodrigues - como o grande escritor e dramaturgo brasileiro (1912-1980). Tropeço no nome dele quando, uma vez ou outra, folheio o jornal que me entregam todas as manhãs, e não é raro que Nelson Rodrigues seja o autor de alguma notícia de sangue e morte, de uma história soez de que não desdenharia o autor de Beijo no Asfalto, A Mulher Sem Pecado e Toda a Nudez Será Castigada. Hoje, por exemplo, Nelson Rodrigues, o jornalista do Correio da Manhã, escreve sobre o homicídio de João, ajudante de padeiro, 35 anos, assassinado a 15 de Dezembro do ano passado quando recusou praticar sexo oral (ou "fazer sexo oral", como escreve Rodrigues) com Bruno, 26 anos, seu alegado amante. "Revoltado", Bruno bateu com a estaca de uma vinha da Vacariça, Mealhada, na cabeça de João. Não satisfeito, "ainda lhe desferiu um golpe com um punhal e despiu-o". "Queria-o ver nu. Já o tinha visto antes. Foi uma coisa que me passou pela cabeça", terá dito o homicida durante o interrogatório.  Lá onde estiver (liberdade poética), Nelson Rodrigues talvez ainda possa escrever uma derradeira e contundente tragédia partindo apenas destas frases. E em bom português.